Entenda os direitos sobre marcas no K-pop
Autora: Ana Clara Ribeiro, advogada de Propriedade Intelectual, escritora e pesquisadora.
31 de Maio de 2023.
De tempos em tempos, vemos casos de grupos de K-pop que dão disband, ou que não renovam contratos com sua empresa, mas que desejam continuar juntos. Fica uma dúvida: os membros teriam direito de continuar usando o nome do grupo? Afinal, de quem são os direitos sobre esse nome?
Essa discussão gira em torno de estratégias de Propriedade Intelectual, mais especificamente, sobre marcas registradas.
Para entender quem pode usar o nome do grupo, é preciso saber quem tem os direitos sobre as marcas que levam o nome do grupo. Vamos entender como isso funciona no K-pop?
Quem é o “dono” da marca no K-pop?
A Coreia do Sul segue o mesmo sistema que o Brasil em relação ao registro de marcas: o sistema atributivo. Isso significa que aquele que conseguir o registro da marca primeiro se torna titular dela. Essa regra pode ter exceções, mas em geral, é assim que funciona.
No K-pop, é comum que as empresas solicitem o registro da marca perante o escritório de propriedade intelectual coreano (KIPO – Korea Intellectual Property Office) em seu próprio nome. Quando o registro de marca é concedido, a empresa se torna a titular da marca registrada.
Geralmente, a empresa de K-pop tem todos os direitos sobre a propriedade intelectual relacionada aos grupos, inclusive os direitos sobre marcas — ou seja: os nomes e até mesmo os logotipos dos grupos.
Isso é uma prática de mercado comum no K-pop e costuma vir prevista nos contratos que os idols assinam com as empresas. Do ponto de vista jurídico, não há nada ilegal em uma agência controlar as marcas usadas para promover os grupos de K-pop.
Por que as empresas de K-pop registram as marcas dos grupos?
As empresas precisam dos direitos sobre as marcas para poder fazer uso delas: promovendo os seus grupos, criando páginas na Internet, licenciando a marca para lançar produtos, tomando medidas contra usos indevidos de marca realizados por terceiros, entre outras medidas.
A forma mais fácil e financeiramente proveitosa de fazer tudo isso é ter os direitos sobre as marcas. Se elas fossem registradas nos nomes dos idols, a empresa precisaria da autorização deles para fazer uso das marcas.
Isso nos leva a uma outra questão: ter os direitos sobre as marcas também é uma forma das empresas se resguardarem caso os grupos decidam ir para uma outra empresa, ou até mesmo decidam trabalhar de forma independente. Afinal, se os idols quiserem continuar lançando músicas sob o nome do grupo, vão precisar da autorização do titular da marca.
É aí que começam as questões mais delicadas envolvendo registros de marca no K-pop.
O que acontece se um grupo sair de uma empresa e quiser continuar usando o nome?
Não são poucos os casos de grupos que decidem não renovar contratos com as empresas, mas que mantêm interesse em continuar juntos, lançando músicas e fazendo shows.
Nesses casos, se a empresa for titular das marcas registradas, o grupo tem 2 opções:
- Tentar obter os direitos sobre as marcas do grupo (seja por meio de um acordo, uma negociação, ou medidas administrativas ou judiciais);
- Criar um novo nome (isto é, uma nova marca).
Casos emblemáticos envolvendo direitos de marcas de grupos
Como eu disse, não foram poucas as vezes em que vimos disputas sobre marcas no K-pop. Vamos conhecer alguns dos casos mais notórios.
T-ARA
O T-ARA foi um dos grupos mais famosos da segunda geração do K-pop. Após quase 10 anos na MBK Entertainment, as meninas do grupo decidiram seguir carreira de forma independente. Porém, elas foram surpreendidas ao saber que a MBK tinha protocolado pedidos de registro da marca “T-ARA” e decidiram intervir nos processos de registro das marcas. Deu certo: o Korea Intellectual Property Office negou os pedidos de registro à MBK.
BEAST / HIGHLIGHT
O grupo Beast debutou em 2009 pela CUBE Entertainment e permaneceu nessa empresa até o final de 2016, quando o contrato deles terminou. Os membros optaram por não renovar o contrato, mesmo continuando com o desejo de continuarem na indústria musical como um grupo. Assim, os membros tentaram negociar os direitos sobre a marca “BEAST” com a CUBE, mas não deu certo. Por isso, em 2017, o grupo anunciou o seu novo nome: HIGHLIGHT.
GOT7
Fugindo um pouco do que costuma acontecer, esse foi um caso que aparentemente terminou bem.
O GOT7 foi formado pela JYP Entertainment, tendo debutado em 2014 e lá ficando até 2021, quando deixaram a empresa. O grupo optou por seguir junto mesmo após o fim do contrato. Ao procurar a JYP para tratar sobre o direito sobre a marca “GOT7”, os membros conseguiram chegar a um acordo para que a JYP transferisse os registros para os nomes deles. Pelo que os meninos contam nas entrevistas, tudo ocorreu de forma amigável e a maior dificuldade nem teria vindo da JYP, mas sim, do fato de que alguns dos membros não residem na Coreia, o que demandou um pouco mais de burocracia na formalização do procedimento.
GFRIEND
O caso das meninas do GFRIEND é um pouco parecido com o que ocorreu com o T-ARA. A Source Music nunca tinha solicitado os registros de marcas “GFRIEND” enquanto o grupo estava ativo; só fez isso quando o grupo estava prestes a dar disband. Porém, a Source Music não teve sucesso no registro das marcas, que foi negado pelo Korea Intellectual Property Office.
INFINITE
Em 2023, foi noticiado que os membros do grupo INFINITE conseguiram adquirir os direitos sobre as marcas do grupo. Esses direitos pertenciam à empresa Woolim Entertainment, que cuidou da carreira do grupo por mais de 10 anos até a saída do último membro do grupo, Nam Woohyun.
Os membros do INFINITE criaram uma empresa para administração dos negócios relacionados ao grupo após a saída da Woolim. Essa empresa é agora a titular das marcas “INFINITE”, e inclusive, das marcas “INSPIRIT” (nome do fandom do grupo).
A mídia coreana noticiou que o acordo com a Woolim Entertainment para transferência das marcas foi amigável, o que sugere uma similaridade com o precedente aberto pelo GOT7.
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