Matérias

“NOT A FRIEND” É UM GRITO DE LIBERDADE CONTRA TODAS AS NOSSAS RELAÇÕES TÓXICAS

26 de Maio de 2023, Taubaté, São Paulo
Texto por Vitória A. Ferreira

Sorn, desde o início de sua carreira solo, em 2021, lançou músicas com letras poderosas que propõem em seu cerne questionamentos sobre nossos relacionamentos, sejam eles com os outros ou com nós mesmos, e são, muitas vezes, gritos pela nossa liberdade. Seu primeiro lançamento desse ano, “I AM NOT A FRIEND”, não é diferente. Em seu novo single, a cantora do grupo em hiato CLC, destaca relacionamentos tóxicos em um âmbito que não é muito comentado: o das amizades.

Com uma sonoridade peculiar, Sorn apresenta seu trabalho com grande personalidade, já pela primeira frase da canção “When is a friend not a friend? (Quando um amigo não é um amigo?)”, esse questionamento já dá o tom do que virá no decorrer da letra da obra que analisarei agora.  

Apesar de crítico e irônico, a letra não é condescendente ou vitimista, pelo contrário é um questionamento direto sobre o comportamento nas relações de amizade. Vamos analisar cada uma das estrofes da música para captar toda a mensagem.

É importante notar que a letra tem um caráter de diálogo entre, provavelmente, duas amigas, uma sendo o eu-lírico que vai passar por um processo de auto-questionamento até externalizar e comunicar ao outro, no caso a amiga, seus descontentamentos dentro desse relacionamento, passando pelas seguintes etapas: negação, raiva e, enfim, desabafo.

Na primeira estrofe, cantada à capela, como se estivesse ensaiando em um estúdio, Sorn começa:

When is a friend not a friend?Quando um amigo não é um amigo?
Like if on my phone your hand’s in my handComo se pelo telefone sua mão estivesse na minha mão
But you ghost, why you call me friend?Mas você some, por que me chama de amiga?

Nesse trecho, percebe-se o questionamento cirúrgico e direto, levando o ouvinte a se questionar sobre sua própria concepção de amizade, afinal, o que torna alguém nosso amigo? O que pode desfazer essa relação?

Nessa estrofe também temos a revelação do contexto para tal pergunta do eu-lírico através da referência ao termo ghosting, que significa a ausência de alguém que você confia quando você mais precisa.

E a música continua:

She said, baby girl, it’s been foreverEla disse, querida, há quanto tempo
Did I forget? Must’ve lost your numberEu esqueci? Devo ter perdido seu número
Sorry, I’ve just been so unavailableDesculpe, eu estava um pouco ocupada

Dividimos a segunda estrofe em duas partes, nessa primeira colocada acima, temos a presença da interlocutora, a provável amiga. Pode-se perceber nesse trecho que ela volta e age como se nada tivesse acontecido, levando o eu-lírico a primeira etapa, a negação:

I can barely breatheEu quase não consigo respirar
Feel like I’m inside walls around my mind Como se estivesse dentro dos muros da minha mente
And my paranoia’s eating me aliveE minha paranoia está me agonizando
I just can’t believe, half the things I seeEu não acredito na metade das coisas que eu vejo
Haven’t been myself, no, I’ve been half-asleepNão tenho sido eu mesma, não, eu não tenho dormido bem

Esse comportamento da interlocutora leva o eu-lírico a sofrer um gaslightining, pois ele desenvolve um sentimento de aflição, como demonstrado nas duas primeiras estrofes, levando-o a questionar sua própria sanidade, desconfiando de si mesmo e de seus sentimentos em relação a esse relacionamento, chegando ao ponto de achar justificativas racionais para esses pensamentos, explícito na última estrofe.

When is a friend not a friend?Quando um amigo não é um amigo?
Like if on my phone your hand’s in my handComo se pelo telefone sua mão estivesse na minha mão
But you ghost when I needed you the most thenMas você some, por que me chama de amiga?
Why you call me friend? (why you call mе friend?)Por que me chama de amiga? (por que me chama de amiga?)

No terceiro verso da música, apesar da introdução similar, ela apresenta uma novidade sobre a perspectiva do eu-lírico, ao afirmar a ausência da amiga quando ela mais precisava, questionando-a o porquê, então, dela chamá-la de amiga, se ela simplesmente sumiu. Nesse momento, temos o início do processo de raiva da canção e o eu-lírico começa a comunicar o motivo de sua decepção e questionamentos iniciais, o que segue no próximo verso:

Crazy how it’s taking me forevеrQue loucura isso estar durando tanto tempo
Just to figure out one thing I neverApenas me dar conta de uma coisa que eu nunca
Are you, were you ever really on my side?Você está, você esteve realmente do meu lado?
But it’s not that deepMas não é tão profundo
So you like to say in that drama type of wayEntão, você quer que eu diga de forma dramática
And not like an Oscar, like a cabaretNão como em um Oscar, mas em um cabaré
I just can’t believe, half the things I seeEu não acredito, a metade das coisas que eu vejo
Something else is underneath the masqueradeTem algo a mais por baixo da máscara

Aqui vemos como Sorn continua sua letra ironizando o decorrer dessa conversa, tentando achar uma forma de expressar seu descontentamento com essa amizade, achar o tom para expor seus sentimentos e questionando, diretamente, qual era o tipo de relação que elas tinham, mesmo após tanto tempo, expondo a realidade da falsidade daquela amizade.

Por fim, na última parte da música, o eu-lírico retoma seus questionamentos, respondendo a própria pergunta e fechando o contexto dessa história:

When is a friend not a friend? Quando um amigo não é um amigo?
Like if on my phone your hand’s in my hand Como se pelo telefone sua mão estivesse na minha mão
But you ghost when I needed you the most then Mas você sumiu quando eu mais precisei
Why you call me friend? (why you call mе friend?)Mas você some, por que me chama de amiga?
(Why did you do that? Why you, why you call me?) Por que você fez isso? Por que, por que você me liga?
When is a friend not a friend?Quando um amigo não é um amigo?
‘Cause I’m ripping out a knife outta my back againPorque estou tirando a faca das minhas costas de novo
Oh, I needed you the most thenEu precisava de você
Why you call me friend? (why you call me friend?) Por que você me chama de amiga? Por que você me chama de amiga?

Nessa última estrofe, Sorn, termina sua canção nos revelando que não foi a primeira vez que o eu-lirico sofreu decepções de seus amigos, mas, é mais uma vez que isso aconteceu. Ela continua a tentar entender como alguém chama o outro de “amigo” se não condiz com o significado dessa palavra, mas, sim, de um relacionamento tóxico que envolve traição, ausência e que leva uma das partes a questionar sua própria sanidade e a sentir-se culpada.

Porém, no fim, todo esse questionamento e raiva, torna-se um grito de liberdade, pois, enfim, o eu-lírico conseguiu comunicar seus sentimentos e expor seu ponto de vista sobre determinado acontecimento, que levou a esse conflito. A música “NOT A FRIEND” de Sorn nos inspira a fazer o mesmo: comunicar o que nos incomoda e, por mais doloroso que seja, a cortar laços que nos façam mal e nos anulem. 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *