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Entre o impeachment e a defesa: polarização de gênero nas manifestações sul-coreanas

03 de dezembro de 2024. Data histórica para um país no leste asiático. O dia em que o presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk Yeol, declarou “lei marcial de emergência”.

Após esse fatídico dia na história do país, muito se desenrolou dentro e fora do campo político. Protestos todos os dias, cantorias, pedidos de impeachment e inúmeras discussões no parlamento.

Entre muitas confusões e demandas, uma coisa foi bastante perceptível pela população: a baixa presença de jovens do sexo masculino nos protestos anti-Yoon. 

Uma pesquisa feita pela BBC Coreia constatou a indicação de que a maioria dos participantes, nos protestos a favor do impeachment do presidente, era composta por mulheres jovens e homens na faixa dos 50 anos.

A participação jovem masculina foi de apenas 3,3%, uma queda significativa em relação a protestos de anos anteriores, como os de 2008 e 2016, onde a presença masculina era muito mais expressiva. Em contraste, as mulheres jovens, com uma participação de 17,7% (cerca de 35.926 mulheres), estiveram em grande número nas ruas, o que gerou surpresa e levantou questões sobre os motivos dessa diferença.

Nas redes sociais, as pessoas se perguntavam: “Cadê os homens jovens desse país?” 

Segundo alguns estudiosos, a diminuição da participação de homens pode estar ligada a mudanças culturais, ao serviço militar obrigatório e a imensa onda de conservadorismo que atinge o país nos últimos anos.

Entre tantas críticas, muitos homens se justificaram, dizendo que estariam nas forças armadas ou trabalhando, e que isso explicaria sua ausência nas manifestações.

Por outro lado, algumas mulheres argumentaram que elas também faziam parte da força de trabalho e que, mesmo com emprego, conseguiam ir aos protestos após o fim do expediente, sugerindo que a falta de presença masculina não estava diretamente relacionada a questões logísticas.

No entanto, uma mudança na composição dos manifestantes foi observada em 14 de dezembro de 2024, após a Assembleia Nacional da Coreia do Sul aprovar o impeachment de Yoon. O gênero presente em maioria nos protestos, que agora defendiam o presidente e gritavam demandas a favor da absolvição de Yoon, eram homens na faixa dos 20 e 30 anos. Essa mudança de postura gerou discussões sobre a verdadeira razão pela qual os jovens homens estavam mais engajados em apoiar Yoon em vez de protestar contra ele.

No domingo, 19 de janeiro de 2025, a participação de jovens do sexo masculino em apoio ao presidente se intensificou, com muitos presentes do lado de fora do tribunal após a aprovação de um mandado de prisão prolongado para Yoon. Apesar de algumas manifestações radicais, que levaram à detenção de 90 pessoas, a presença de homens jovens se destacou. 

Na manhã antes da prisão do presidente, muitos seguravam cartazes manifestando seu apoio: “Não se preocupe, presidente Yoon Suk Yeol, nós, com 20 e 30 anos, estamos ao seu lado”.

Um dos jovens manifestantes disse ao jornal The Korea Herald que: “Acredito no presidente quando ele diz que nossa política é manipulada e está sendo conduzida por forças pró-Norte e anti-estatais”.

Segundo alguns especialistas ouvidos, a participação de mulheres jovens nos protestos anti-Yoon também pode ter incentivado os homens a se mobilizarem em defesa do presidente. A pressão para preservar as estruturas tradicionais de gênero e o sentimento de urgência entre os jovens conservadores levou a esse crescente apoio ao presidente por parte da parcela jovem masculina do país. 

E é falando em conservadorismo e ameaça às estruturas tradicionais de poder de gênero que chegamos a um ponto bastante discutido ultimamente nas redes sociais e mídias tradicionais coreanas, tal como no restante do mundo: o machismo extremo em ascensão. 

O presidente Yoon Suk Yeol é um político pertencente ao Partido do Poder Popular, um partido majoritariamente voltado para os ideais da direita, em outras palavras, defendem ideias conservadoras. As promessas de campanha de Yoon incluíam a abolição do Ministério da Mulher e da Família e a implementação de penas mais severas para casos de difamação, especialmente em acusações de agressão sexual, que só reconhece casos de estupro se houver provas de uso da violência. Mesmo sem o consentimento da mulher, se não houver violência física, e ela denunciar, será considerado apenas um caso de difamação da mulher contra o homem.

A proposta de eliminar o sistema de metas de emprego voltadas para mulheres também gerou apoio entre os homens, que argumentam que esse sistema resultaria em uma discriminação contra os homens no mercado de trabalho. O apoio a essas políticas reflete a crescente divisão ideológica no país, com jovens do sexo masculino aderindo a posturas mais conservadoras, especialmente em relação às questões de gênero.

Essa divisão ideológica se reflete também em uma tendência global observada nas últimas décadas, onde jovens mulheres tendem a adotar ideologias mais progressistas, enquanto os homens mais jovens se alinham com posturas conservadoras. A Coreia destaca-se por assumir o posto mundial do país com maior disparidades políticas entre os gêneros dentre os jovens.

Falando sobre a Coreia do Sul, a divisão ideológica entre liberalismo e conservadorismo é influenciada por um fator extra se comparado a outros países: a Guerra das Coreias. Os conservadores defendem laços fortes com os EUA e pressões sobre a Coreia do Norte. Liberais, por sua vez, acreditam que a aproximação e a ajuda econômica podem trazer benefícios. O fato dos homens serem obrigados a servir nas forças armadas o que os ligam diretamente a questões militares e as mulheres estarem enfrentando perdas graduais de direitos conquistados ao longo dos anos contribui para uma diferença ideológica cada vez mais marcante entre os sexos.

Essa disparidade ideológica e política tem sido um dos fatores que moldam a dinâmica atual dos protestos na Coreia do Sul. Para muitos, a questão do serviço militar obrigatório e a maneira como a política de gênero está sendo conduzida no país são centrais para entender as divisões que marcam o atual cenário político-social sul-coreano. A polarização entre os sexos e suas ideologias reflete um fenômeno global, mas com características particularmente intensas na Coreia do Sul.

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Sobre o autor

Jornalista formada pela UFPE (Universidade Federal de Pernambuco). Apaixonada por música, cultura pop e línguas estrangeiras. Sugestão de pautas: ylanalira@hotmail.com

(1) Comentário

  1. Valdivio Monteiro diz:

    Parabéns pela excelente matéria expondo um tema mundialmente bem espinhoso.!

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