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HIT!Review: TXT imerso em anemoia: analisando “Deja Vu” 

Texto: Duda Jerman e Larissa Garcia
Design: Barbara

São Paulo, 26 de agosto de 2024.

Em 1º de abril deste ano, o grupo TOMORROW BY TOGETHER (TXT) lançou o seu sexto mini-álbum intitulado “Minisode 3: Tomorrow”. Descrito no site da BigHit como “a história de um menino que se lembra de uma promessa passada e sai em busca de ‘você’ com quem ele fez a promessa”, é um projeto que conta com o enredo de reencontrar o seu propósito. No mesmo dia do lançamento do mini-álbum, o canal oficial da HYBE lançou o MV de “Deja Vu”, faixa produzida por slow rabbit, Martin e Hitman Bang

O termo “Déjà vu”, originário do Francês e traduzido como “já visto”, descreve a sensação de ter experimentado certo evento anteriormente. O MV começa com uma referência ao clássico literário “O Pequeno Príncipe”, parafraseando a frase icônica: “É apenas com o coração que se enxerga corretamente; o essencial é invisível aos olhos”. Dirigido por Yu Kwang Goeng, o MV faz referências a várias eras anteriores dos meninos, assim como a vários momentos icônicos do K-pop da segunda geração, como um verdadeiro Déjà vu. 

 As referências às eras passadas nos lembram que no debut, como personagens do complexo enredo do grupo, os membros fizeram a promessa de relembrar os nomes de cada um enquanto seguiam suas histórias individuais, porém, enquanto seguiam elas, as memórias se foram. O objetivo em “Deja vu” é claro: traduzir visualmente a frase de abertura do clipe, “Como algumas coisas são preciosas, mas invisíveis aos olhos, nós as esquecemos com o passar da vida”, e reforçar a ideia de que eles precisam uns dos outros para se reencontrar e lembrar. 

A letra da música é um show de nostalgia, com diversas referências às antigas eras do grupo, como “Você e eu, sob a promessa estrelada”, nos lembrando dos anseios relatados em “Nap of a Star” e das promessas que o eu-lírico menciona em “Magic Island”. A sequência da letra “Diante da nossa coroa acumulada de poeira” remete a “Crown”, música do próprio debut. O recurso literário de trazer imagens, sons e palavras de outras obras para gerar a sensação de pertencimento, além do acolhimento, contribuem para a sensação de déjà vu, mesmo para quem ouviu a música antes de assistir ao MV.

Já na análise do vídeo, vemos Yeonjun correndo atrás de uma luz roxa, com unicórnios gigantes ficando para trás, uma cena metafórica sobre a busca incessante pelo mundo lúdico da imaginação de “Magic Island”. Algumas outras cenas remetem a esse universo, por exemplo, como ocorre quando Kai inclina seu corpo próximo ao mar, como se estivesse imerso em seu sonho.

É natural que ao pensar no passado e em tempos mais simples, os sentimentos se misturem. A cena com crianças mascaradas correndo entre os integrantes simboliza essa jornada pela juventude e as máscaras que usamos ao longo da vida, sejam elas do campo da imaginação ou da tentativa de se ajustar à sociedade, um dos temas mais fortes de “Can’t You See Me”. 

No que diz respeito à composição fotográfica, a luz possui um papel crucial na narrativa e aqui eles se apropriam muito bem dela, transmitindo e traduzindo a intensidade da letra e da melodia: no início as imagens estão em preto e branco, destacando a ausência das memórias e traçando, talvez, um paralelo entre a infância e a vida adulta, enquanto elementos coloridos sutilmente invadem certos cenários indicando essas lembranças persistentes. Com esses elementos, a obra realmente provoca um déjà vu, ecoando temas similares explorados em “Blue Hour”, mas sem o véu do conto de fadas. 

A iluminação forte, apesar de escura no refrão, adiciona a intensidade das afirmações do eu-lírico ao dizer “meu futuro é você”, especialmente com a tonalidade roxa que é utilizada nos efeitos visuais, semelhante à luz sendo perseguida no início do MV. Ali também somos lembrados novamente “que o essencial é invisível aos olhos” já que a luz ultravioleta — uma tonalidade de roxo — é invisível ao olho humano.

A mensagem de passagem de tempo ecoa pela letra, pelo vídeo e pela composição musical, já que a letra olha para o futuro e a composição para o passado. Umas das frases da música é “Sem saber a razão das minhas lágrimas, anemoia”. O último termo, por definição, expressa a sensação de nostalgia e saudade de algo nunca vivido anteriormente, que nos ajuda a entender a complexidade do conceito e faz conexão com o título da faixa. Afinal, além das referências aos próprios lançamentos anteriores, o TXT traz um prato cheio para os fãs de K-pop “das antigas” ao referenciar o som e o imaginário da segunda geração (aproximadamente 2006-2013). Apesar de eles não terem vivido essa época como idols, sabem a importância dela para a indústria e para os fãs.

Visualmente temos a referência ao MV de “Action” (2012) do ex-grupo NU’EST, como labirinto de ferros e luzes, que é apresentado no refrão, junto do contraste de preto & branco e da fonte das iluminações frontais. Já sobre o figurino, ele é familiar ao usado pelo boygroup SS501 em “Love Ya”, de 2011, com os cortes na parte traseira dos blazers e as rendas decorativas sendo o aspecto moderno trazido ao TXT

Não podemos continuar essa análise sem mencionar INFINITE, o boygroup que provavelmente teve mais influência sobre o som e coreografia de “Deja vu”. Um dos maiores grupos da segunda geração, os membros  eram conhecidos pelo vocal poderoso, coreografias elaboradas e visuais únicos. Em “Last Romeo”, 2014, temos uso de luz e fumaça da mesma forma que no MV de TXT, além do imaginário de correr atrás de algo ou alguém aparentemente inalcançável. Também é possível entender a nostalgia da sonoridade de “Deja vu” ao ouvir “Request”, 2013, e por fim, existem características semelhantes notáveis à coreografia de “Dilemma”, 2015. 

Mesmo para os fãs de K-pop da época que não acompanhavam esses grupos específicos, o tipo de melodia, coreografia e visual remetem a década de 2010 e as características marcantes da segunda geração. Quem viveu essa época sente o déjà vu e aqueles que não viveram, a anemoia. 

Dessa forma  MV de “Deja Vu” é retrato de uma jornada cíclica, já que as experiências futuras precisam de um início no tempo passado. E ao usar referências de si mesmos e de outros grupos, enxergamos essa ciclicidade em movimento. O que se inicia com Yeonjun correndo sozinho e finaliza com todos os cinco membros correndo juntos é o símbolo do lema que o próprio nome do grupo sugere, TOMORROW BY TOGETHER (juntos construir o novo amanhã).

Não só pela união dos membros, mas do coletivo das memórias dos fãs e do trabalho feito anteriormente dentro da indústria, “Deja Vu” é uma representação digna de como usar, com sensibilidade e criatividade, a nostalgia para que, além da memória revivida, ela gere uma nova experiência afetiva.

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